O Jumento de Imbauba (conto)
O cerco em volta da Fazenda
Imbaúba do Coronel Ximenes pelos cabras dos Mererés já levava meses. Os
sitiados resistiam bem, já que tinham reunidos víveres e munição em grande
quantidade.
Ao contrario, os sitiantes,
que por causa da difícil geografia daquele sertão e de suas lonjuras, via o
moral de sua tropa cair vertiginosamente e as deserções ocorrer com cada vez
mais frequência.
Foi quando o mulato
Oliveiros, cria bastarda do Padre Limaverde, vigário do Ipu com quem
aprendera a ler e escrever, tendo tido inclusive acesso aos Clássicos em grego
e latim, dirigiu-se ao comandante Capitão Mané Lau dizendo saber
como desalojar o inimigo.
“Deixe de rodeios e diga logo
o que tem a dizer, cabo! Se me vier com bestagens mando aplicar-lhe logo uma
pisa de urtiga cansanção”
O cabo enxerido sugeriu então
ao seu superior que incumbisse Mestre Zé Abrão, santeiro afamado e furriel da
tropa, de construir um jumento de mulungu em tamanho natural, o qual seria
enviado na véspera do dia de Reis aos sitiados como sendo uma réplica benzida
do asno em cujo lombo o Menino Jesus escapara para o Egito.
“Um jumento? E tu acha mesmo
que pode dar certo?”
“Deu uma vez na antiga
Grécia, na guerra contra Troia, meu comandante. Só que la usaram um cavalo”
O Capitão mesmo sem botar
muita fé deu a autorização. E o jumento foi feito numa noite.
Quando na manhã
seguinte os guardas viram o tão perfeito jumento de pau deixado na
porteira principal da fazenda, associaram imediatamente a sua imagem com a
cavalgadura em que o divino infante evitara tornar-se vitima do sanguinário rei
Herodes; ficaram comovidos e o levaram para dentro.
Eurípedes Afrânio,
genro do Coronel, não era homem de armas. Alias, suas armas eram outras:
a pena, o saber. Ao ver a soldadesca conduzindo em procissão o jumento de
madeira e o colocando diante da capela, riu pelas ventas.
“O senhor meu sogro já ouviu
falar da historia do Cavalo de Troia?”
“E lá é hora de ficar ouvindo
historia, rapaz?”
“Ouça e vai entender o que eu
quero dizer. Tem muito a ver com a nossa situação neste momento”
Mais por insistência da filha
Zefinha que por vontade própria, o fazendeiro e chefe- político permitiu que
Eurípedes contasse sobre a tal historia da Guerra de Troia.
“Então é isso?”,
admirou-se o Coronel no final. “Pensa a canalha que pode me fazer de otario?
Vou mostrar pra eles que Ximenes Saião não cai num truque besta desses”
E imediatamente mandou seus
jagunços juntarem lenha e botarem fogo na obra do Mestre Zé Abrão.
Mal as chamas subiram,
ocorreu uma enorme explosão provocada pelas bananas de dinamite colocadas pelos
Mererés na barriga do jumento.
Foi dessa forma besta que
a desafortunada imbaúba, como a desditosa Troia de antigamente,
finalmente caiu.