Tomou-lhe a mão esquerda fria entre as suas e, disfarçadamente, tentou retirar do seu dedo gordo a aliança de ouro bem fornida, porém gasta pela sucessão das tantas bodas que comemoraram juntos. Se da vida nada se leva, concluiu, de nada mais haveria de servir à sua defunta esposa aquele maldito elo dourado que lhes algemara as almas por meio século. Não conseguindo, lamentou em voz baixa: uma pena. Mas logo reconfortou-o a certeza da existência em algum lugar de uma apólice de seguros acenando com uma revoada de notas de cem, cinqüenta... novinhas. Revirou a casa, quase botou abaixo as paredes sisudas entre as quais procriaram, cresceram e se multiplicaram e envelheceram e nada encontrou. Irritou-se. Blasfemou. Perdeu o que lhe restava de compostura. Deu para acusar a prole pelo sumiço do documento. Ameaçava deserdá-los a todos. Como um imóvel avariado que ameaçasse desabar interditaram-no. Mingou. A aliança delgada frouxa dançando no dedo. À filha solteirona coube o fardo de cuidá-lo. Elisa não se lastima: vive de espera. Seu príncipe tem a cara de Dom Sebastião. Para passar o tempo inventa coisas inúteis como tricotar cachecóis de lã que nunca serão usados naquele sertão agreste onde vivem confinados.
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