01 junho, 2015

O Jumento de Imbauba (conto)


O Jumento de Imbauba (conto)

  

O cerco em volta da Fazenda Imbaúba do Coronel Ximenes pelos cabras dos Mererés  já levava meses. Os sitiados resistiam bem, já que tinham reunidos víveres e munição em grande quantidade.

Ao contrario, os sitiantes, que por causa da difícil geografia daquele sertão e de suas lonjuras, via o moral de sua tropa cair vertiginosamente e as deserções ocorrer com cada vez mais frequência.


Foi quando o mulato Oliveiros, cria bastarda do  Padre Limaverde, vigário do Ipu com quem aprendera a ler e escrever, tendo tido inclusive acesso aos Clássicos em grego e latim,  dirigiu-se ao comandante Capitão Mané Lau  dizendo saber como desalojar o inimigo.

 

“Deixe de rodeios e diga logo o que tem a dizer, cabo! Se me vier com bestagens mando aplicar-lhe logo uma pisa de urtiga cansanção”

 
O cabo enxerido sugeriu então ao seu superior que incumbisse Mestre Zé Abrão, santeiro afamado e furriel da tropa, de construir um jumento de mulungu em tamanho natural, o qual seria enviado na véspera do dia de Reis aos sitiados como sendo uma réplica benzida do asno em cujo lombo o Menino Jesus escapara para o Egito.

“Um jumento? E tu acha mesmo que pode dar certo?”


“Deu uma vez na antiga Grécia, na guerra contra Troia, meu comandante. Só que la usaram um cavalo”

 
O Capitão mesmo sem botar muita fé deu a autorização. E o jumento foi feito numa noite.
 

Quando na manhã  seguinte os guardas viram o tão perfeito jumento de pau deixado na porteira principal da fazenda, associaram imediatamente a sua imagem com a cavalgadura em que o divino infante evitara tornar-se vitima do sanguinário rei Herodes; ficaram comovidos e o levaram para dentro.

 

Eurípedes Afrânio,  genro do Coronel, não era homem de armas. Alias, suas armas eram outras: a pena, o saber. Ao ver a soldadesca conduzindo em procissão o jumento de madeira e o colocando diante da capela, riu pelas ventas.
 
“O senhor meu sogro já ouviu falar da historia do Cavalo de Troia?”

 
“E lá é hora de ficar ouvindo historia, rapaz?”


“Ouça e vai entender o que eu quero dizer. Tem muito a ver com a nossa situação neste momento”

 
Mais por insistência da filha Zefinha que por vontade própria, o fazendeiro e chefe- político permitiu que Eurípedes contasse sobre a tal  historia da Guerra de Troia.


“Então  é isso?”, admirou-se o Coronel no final. “Pensa a canalha que pode me fazer de otario? Vou mostrar pra eles que Ximenes Saião não cai num truque besta desses”

 
E imediatamente mandou seus jagunços juntarem lenha e  botarem fogo na obra do Mestre Zé Abrão.

Mal as chamas subiram, ocorreu uma enorme explosão provocada pelas bananas de dinamite colocadas pelos Mererés na barriga do jumento.

 
Foi dessa forma besta que  a desafortunada imbaúba, como a desditosa Troia de antigamente, finalmente caiu.